#8 Ideias para sobreviver ao fim do mundo (coletivo e individual)
Vale tentar reencontrar aquele pedaço que deu início a tudo e, com um pouco de nostalgia, acreditava poder mudar o mundo para sobreviver.
Tenho passado (ou já passei e esse, agora, é um novo passo) por um momento de desconcentração criativa. Não chamo de bloqueio, mas uma falta de concentração e espaço para que a subjetividade e o vazio que criação pede sejam possíveis. Crise e mudanças no trabalho, frustrações na área das relações interpessoais (como é difícil fazer amigo depois dos 30) e os dramas de pertencimento e apego vivenciados por alguém que vem de outra cidade, outra região, coisa que quem nunca migrou para vivências quase opostas jamais vai entender.
Tudo isso é capaz de criar um emaranhado difuso, que afrouxa as linhas do sonho e preenche (ainda que por um período temporário) os buracos de vazio tão essenciais para pensar na criação. Sim, é preciso vazio.
Mas, aos poucos, tenho esticado as linhas, retomado as costuras e recuperado meu precioso ócio interno, também conhecido como aquele tempo pra não pensar em nada, nem planejar, ou apenas para inventar algumas bobagens. Algo se ajeita na costura do tempo e, se há algum aprendizado nessas três décadas de vida, é esse, observar o tempo e acompanhar com certa doçura e condescendência a sua passagem.
Agora, vamos voltar ao título. Eu li esse baita livro pequenino do Ailton Krenak, Ideias para adiar o fim do Mundo, há algum tempo e já tinha um exemplar em casa muito bem localizado na prateleira azul da minha estante de livros dividida por cores que alguns de vocês já conhecem. E então um novo exemplar chegou por aqui pelas mãos do Cris (meu companheiro) repetido e presenteado, como um lembrete para retomar a leitura.
Eu, que tenho certa mania a enxergar sinais (ou inventar minhas próprias coincidências para impulsionar vontades), entendi a chegada repetida do livro como um convite para dar um basta ao meu próprio fim de mundo particular.
Sim, soa um pouco dramático, mas eu funciono um tanto assim aqui por dentro. Mas, é preciso compreender também que o drama não é tanto. Enquanto me desdobro com os trabalhos e preocupações mais cotidianas como juntar dinheiro, planejar carreira, escrever e entender os próprios passos, me permitir sofrer e mergulhar no drama com as frustrações da vida, o mundo meio que tem se acabado também do lado de fora.
O livro chegou naquela fatídica semana em que tudo queimava e parecia que nossos horizontes seriam reduzidos ao pó. Vi imagens de Brasília, minha cidade, coberta de fumaça e do Parque Nacional, que tanto amo, em chamas.
Eis que o fim do meu mundo interno coincide e junta forças com o fim de mundo externo e coletivo e a gente parece que, de uma forma ou outra, acaba por colapsar. Mas, vamos voltar ao sinal de recomeço, ao título que me busca: ideias para sobreviver ao fim do mundo.
O livro de Ailton Krenak, é uma reflexão profunda sobre a crise ambiental, o relacionamento da humanidade com a natureza e as perspectivas do povo indígena frente às mudanças globais. Krenak, líder indígena e ativista brasileiro, expõe como a visão de mundo ocidental, centrada no consumo e na exploração dos recursos naturais, está levando o planeta a um colapso.
Ele questiona a ideia de progresso que desconsidera a interdependência entre os seres humanos e o meio ambiente, defendendo a necessidade de repensar nossas ações para adiar o "fim do mundo".
Pois bem, aqui vocês me desculpem por me banalizar um pouco as ideias tão profundas de Krenak, mas, revisitando as páginas desta pequena pérola, me lembrei também que a mudança externa começa a partir do interior, então, para mudar o mundo e adiar seus possíveis fins é preciso resgatar certa dose de otimismo.
E, depois de tantas voltas, retorno ao ponto inicial: o desânimo criativo. Lidar com o colapso do mundo de fora não é fácil, menos ainda com os pequenos (ou grandes) colapsos constantes da vida adulta, então, depois de chorar, pensar, desistir, respirar e retomar, existe também espaço para juntar os caquinhos, limpar do corpo a poeira e a fuligem e tentar encontrar algum espaço interno para criar.
Esse é um primeiro passo. Sempre adorei falar de literatura, escrita, mulheres e processos criativos e, depois de acreditar, a partir do olhar externo, que eu não teria tanto a dizer, vale tentar reencontrar aquele pedaço que deu início a tudo e, com um pouco de nostalgia, acreditava poder mudar o mundo para sobreviver.
Outra vez, recomeçamos.
Aproveito para indicar alguns ótimos livros sobre escrita e processos criativos que li nos últimos tempos. Ler sobre diferentes trajetórias de criação tem me ajudado a retomar a vontade de mergulhar na invenção outra vez. Espero que também te ajude.
(Obs: Se for comprar um desses livros, compre pelo meu link, assim você contribui com a rentabilidade do projeto Elas na Escrita).
DICAS DE LEITURA
1. A escrita como faca e outros textos, Annie Ernaux - Fosforo Editora (compre aqui)
2. A obrigação de ser genial, Betina Gonzáles - Bazar do Tempo (compre aqui)
3. A Viagem inútil, Camila Sosa Villada - Fosforo Editora (compre aqui)
4. Escrever é muito perigoso, Olga Tokarczuk,
(compre aqui)E é claro, deixo aqui a dica de Ideias para Adiar o fim do Mundo, Ailton Krenak (compre aqui)